A matéria abaixo foi publicada no jornal Extra on line, Casos de Polícia, no dia do lançamento do livro, 23 de julho de 2012.
Como podem ver, atribuo a Alfredo Sirkis o protagonismo da interpretação do quadro de Segurança Pública do Rio de Janeiro como semelhante a um Conflito Armado de Baixa Intensidade.
Declaro que a situação é bastante diferente daquela que experimentamos até 2010. A retomada do Alemão e a consolidação das UPPs viraram a página da guerra do Rio.
De 2006 até hoje, quando tive a oportunidade de conversar com o ex-"carbonário", ex-revolucionário Sirkis, quando me visitou no BOPE, muita coisa mudou, mas mesmo tendo pontos de vista muito diferentes na natureza ideológia para organização sócio-política dos Estados, coincidimos muito na leitura que fazíamos para o problema que enfrentávamos no Rio de Janeiro.
Então, aí está. Sirkis foi quem primeiro teorizou a respeito. Eu concordei e lhe concedi a precedência nesta matéria.
Livro de ex-comandante da PM conta ocupação do Complexo do Alemão

Ex-comandante da Polícia Militar, o coronel Mário Sérgio Duarte lança, nesta segunda-feira, um livro sobre a ocupação do Complexo do Alemão. Intitulado "Liberdade para o Alemão – O Resgate de Canudos", a obra conta os bastidores da operação que iniciou a pacificação da comunidade, em 2010. O título faz referência à Guerra de Canudos, na Bahia, no século XIX.
— Canudos era um grande conglomerado pobre, com sua população mergulhada numa de ideologia de fundamento messiânico, engendrada por Antônio Conselheiro. Os homens agiam cometendo crimes que levavam pânico. No caso do Complexo do Alemão, também encontramos um grande conglomerado pobre, com centenas de jovens em armas, cometendo crimes diversos — explicou Mário Sérgio.
Segundo ele, a narrativa vai detalhar os momentos marcantes da operação. Entre eles, a decisão de invadir a Vila Cruzeiro.
— Havia muito risco, mas não havia volta: ou agíamos ou as coisas poderiam se tornar piores — afirmou.
O evento de lançamento do livro será na Academia Brasileira de Filosofia, no Centro, às 19h.
Veja abaixo a entrevista com ex-comandante da PM:
Como surgiu a ideia de escrever um livro sobre a ocupação do Alemão?
Surgiu ainda em meio a operação, após eu haver constatado que tínhamos o Complexo do Alemão sob controle. A ideia me ocorreu ali, e alguns dias depois eu já havia iniciado as primeiras páginas.
O título do livro faz uma referência a Guerra de Canudos. Porque essa associação?
O Arraial de Canudos era um grande conglomerado pobre, na verdade misérrimo, que esteve em armas contras as forças da República com sua população mergulhada numa de ideologia de fundamento messiânico, engendrada por Antonio "Conselheiro". Os homens do arraial agiam comentendo crimes que levavam pânico para as populações dos arredores. No Caso do Complexo do Alemão, também encontramos um grande conglomerado de estrato social pobre, com centenas de jovens em armas, comentendo crimes diversos e espalhando pânico pela cidade. Ambas comunidades sofreram um cerco militar e o desfecho do segundo caso parecia se aproximar do primeiro, porque houve um grande banho de sangue no interior da Bahia e os sinais é que teríamos aqui também. Todavia, lá e cá todos eram brasileiros e tudo que eu preferia era não ser responsável por derramar sangue nacional, se fosse possível, ainda que de "retardatários" compatriotas de vida torta, para usar uma palavra do Euclides da Cunha.
Há alguma revelação ainda não feita sobre este momento?
Várias, mas detalhes de bastidores. Aquilo que as câmeras não mostraram eu procurei contar.
Quais momentos da ocupação o livro aborda?
O livro tem de tudo um pouco. Marcadamente temos os combates da Vila Cruzeiro e o resgate do Alemão, mas há reminicências de minha época no BOPE e uma parte em que narro meu entendimento de que o Rio chegou vivenciar um Conflito Armado de Baixa Intensidade, como muito bem pontuou Alfredo Sirkis há alguns anos (grifo meu), Os governos passados foram cegos para essa realidade e por isso não visualizaram a saída para o caos.
Como ocorreu a decisão da segurança do Rio em tomar, finalmente, o quartel general do tráfico de drogas?
Numa quarta-feira, dia 24 de novembro de 2010, durante os incêndios, o Governador decidiu a invasão da Vila Cruzeiro, e, aí, com a fuga do criminosos para o Alemão, nem foi preciso nova tomada de decisão. Aquela janela de oportunidade não poderia fechar-se. Era uma chance de ouro que a facção nos deu e passaríamos por ela de qualquer maneira.
A decisão já vinha sendo pensada ou foi tomada diante dos inúmeros casos de violência? Não era um momento arriscado para isso?
A decisão de tomar o Alemão naquele momento foi para aproveitar o tiro no pé que o narcotráfico deu em si mesmo. Havia muito risco, mas não havia volta: ou agíamos ou as coisas poderiam se tornar piores, e teríamos um quadro semelhante a de guerra civil nas avaliações de risco e medo.
Ultimamente, com a chegada da PM ao Complexo do Alemão, estamos vendo constantes apreensões de drogas e armas, além de confrontos dos policiais com traficantes. Você acha que pode haver uma retomada por parte do tráfico?
Não creio em retomada. Os conflitos significam o produto da herança histórica que perdurará por um tempo até não mais existir. Mais do que quadrilhas as facções se tornaram uma espécie de uma subnação e um subestado criminoso, com subexércitos, subeconomia e microterritórios. Vencer isso tudo é difícil porque há identidade coletiva adquirida, e não se consegue destruindo, mas descontruindo, o que leva tempo.
Qual o maior desafio das UPPs hoje?
Substituir os efetivos das UPPs pois, pela estratégia da Secretaria de Segurança, não convém ter veteranos nas UPPs e isso exige renovação.
Foi o momento mais importante da cidade? Acredida que haverá outra ocupação como esta?
Sim, foi. O Complexo do Alemão além de Quartel General da maior facção era também seu altar de crenças. Os traficantes julgavam-se a salvo de uma retomada ali, ainda que seus "satélites" caíssem. Quando o seu "sol" foi tomado eles souberam que o império se findara. O modelo coletivizado do crime pelas facções só voltará a acontecer se o poder público permitir, Eu penso que a população nunca mais permitirá. Ao menor sinal de um recrudescimento a cobrança seria imediata
Leia mais: http://extra.globo.com/casos-de-policia/livro-de-ex-comandante-da-pm-conta-ocupacao-do-complexo-do-alemao-5554639.html#ixzz25Kax93No
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