A existência das milícias no Rio de Janeiro tem sua semente na inoperância desenvolvida pelo Estado, nos últimos vinte anos, em oferecer proteção aos policiais; seja no exercício da profissão ou nos atos comuns de suas vidas, como simplesmente transitar, residir ou se socializar.
A carreira policial se tornou de tal ordem perigosa para os agentes públicos, que o risco para si e para sua família deixou de ser uma ilação comum aos profissionais de polícia, mas uma realidade transmutada em fatos, desde que passaram a ser caçados e mortos nas vias, nos espaços de socialização e às vezes em suas casas.
O embrião das milícias se formou, pois, numa tentativa de autoproteção, quando policiais organizaram uma comunidade no bairro de Jacarepaguá, e na qual passaram fazer valer leis locais. O tráfico de drogas, principal atividade “inimiga”, já que são os narcotraficantes aqueles criminosos que mais atentam contra os policiais, foi exposto como antagonista principal, contra a qual a bandeira da organização social policial (que teria por conseqüência as milícias) deveria estar sempre desfraldada.
Logo, a organização ganharia adeptos em outras áreas, em outras comunidades, onde já residiam policiais, os quais organizariam grupos de autodefesas que, a fim de captar recursos para o pagamento dos “serviços” que ampliavam e tornavam mais complexos, passaram a estabelecer tributos cobrados da população; não exatamente em forma de “impostos e taxas periódicas”, como mensalidades, mas por meio de ágio (forma de sobretaxa) para comercialização de serviços, como distribuição de gás, participação na transação de imóveis e distribuição de sinais de tv a cabo, furtado, certamente.
Por ter uma bandeira anti-tráfico, as milícias foram conquistando terreno junto à população e um sem-número de pequenas comunidades passaram preferir-lhes à dominação do narco-negócio e, ante a hipótese de ter o traficante armado, drogado, violento, na sua porta, seduzido-lhes os filhos para seus exércitos, abriram as portas para sua presença e seus serviços irregulares de “segurança privada”, aumentando-lhes o poder e dando-lhes a visibilidade que já atravessa as fronteiras do país.
As milícias são organismos ilegais e ilegítimos, posto que cometem crimes como os apresentados, mas têm sido preferíveis ao tráfico mesmo pelos moradores das populações pobres, onde se instalaram e, principalmente, pelos policiais, já que nas áreas onde se estabelecem não ocorrem ataques, emboscadas, atentados ou qualquer tipo de ação intencional e premeditada contra suas vidas. A população, a seu turno, sente-se mais segura e livre das “balas perdidas”, que tanta vida inocente tem ceifado, além, com certeza, de beneficiar-se dos serviços ilegais, como a recepção dos sinais de televisão-a-cabo furtados, que lhes são vendidos a preços módicos.
As milícias não podem ser entendidas como um serviço complementar aos serviços da polícia, pois são ilegais e cometedoras de delitos. Onde as Polícias não mantém controle e ordem social, ou as comunidades estão sob forte influência de uma, ou de outra dessas forças ilegais, mas as milícias são o fenômeno em expansão e o tráfico em entropia.
O assunto “milícias” abarca outras questões, e uma delas é, seguramente, a ideológica. Explico: as milícias têm nos grupos de inspiração marxista, leninista, maoísta etc, empedernidos adversários; isso porque entendem-nas como “originárias da ordem”, oriundas, em grande parte, delas. Os milicianos são, ou foram, agentes públicos, quer sejam policiais, bombeiros, militares de qualquer Força, agentes penitenciários, guardas municipais, etc. Para esses grupos que entendem o processo revolucionário como instrumento legítimo de justiça social, o fortalecimento das milícias é um entrave aos seus planos, na medida que enfraquecem os braços do narcotráfico com os quais almejam contar numa eventual deflagração do conflito interno, como o protagonizado pela narco-guerrilheira das FARCS. Embora o modelo de aproveitamento do lúmpem não seja uma estratégia marxista, mas anarquista, em razão da falta de opções e incapacidade de angariar quadros para a almejada revolução – hoje mais fortemente acalentada em razão da esquerdização da América do Sul – os grupos de ideologia revolucionária não descartam seu uso como “companheiros de viagem”. Por isso, a existência do narcotráfico armado é fundamental para os quadros revolucionários, cada dia menos preocupados em camuflar suas intenções.
Em resumo, as milícias são estruturas de poder ilegal. Impõem-se pela força e haurem recursos financeiros a partir de expedientes ilegais, como ágios, sobretaxas, exploração e venda de serviços não autorizados. Elegem por inimigo o lúmpem; primeiramente o narcotráfico e, em seguida, os praticantes de roubo e furto, que atuam contra a população. Não entram em confronto com forças policiais, mas só agirão assim enquanto não romperem o limite máximo de suas violações, que é a narcotraficância ultra-rentável. Geralmente controlam as realizações sociais das suas áreas ou, no mínimo, interferem nelas, impedindo a realização de expressões culturais que julgam anti-sociais e de exaltação do poder adversário, como bailes funk e seus “proibidões”. Contam com a simpatia de considerável parte da população, não têm formação ideológica, são partidárias de políticas fisiológicas, populistas, e são consideradas inimigos formais e obstáculos cruciais ante uma estratégia que contemple a mobilização das armas do lumpesinato, para uma revolução.
Concluindo: Nenhuma dessas forças é legítima e, sem cegueiras e sem manipulações ideológicas, o Brasil precisa enfrentar e derribar as expressões da antidemocracia.
O Estado pode e a Nação merece.
A carreira policial se tornou de tal ordem perigosa para os agentes públicos, que o risco para si e para sua família deixou de ser uma ilação comum aos profissionais de polícia, mas uma realidade transmutada em fatos, desde que passaram a ser caçados e mortos nas vias, nos espaços de socialização e às vezes em suas casas.
O embrião das milícias se formou, pois, numa tentativa de autoproteção, quando policiais organizaram uma comunidade no bairro de Jacarepaguá, e na qual passaram fazer valer leis locais. O tráfico de drogas, principal atividade “inimiga”, já que são os narcotraficantes aqueles criminosos que mais atentam contra os policiais, foi exposto como antagonista principal, contra a qual a bandeira da organização social policial (que teria por conseqüência as milícias) deveria estar sempre desfraldada.
Logo, a organização ganharia adeptos em outras áreas, em outras comunidades, onde já residiam policiais, os quais organizariam grupos de autodefesas que, a fim de captar recursos para o pagamento dos “serviços” que ampliavam e tornavam mais complexos, passaram a estabelecer tributos cobrados da população; não exatamente em forma de “impostos e taxas periódicas”, como mensalidades, mas por meio de ágio (forma de sobretaxa) para comercialização de serviços, como distribuição de gás, participação na transação de imóveis e distribuição de sinais de tv a cabo, furtado, certamente.
Por ter uma bandeira anti-tráfico, as milícias foram conquistando terreno junto à população e um sem-número de pequenas comunidades passaram preferir-lhes à dominação do narco-negócio e, ante a hipótese de ter o traficante armado, drogado, violento, na sua porta, seduzido-lhes os filhos para seus exércitos, abriram as portas para sua presença e seus serviços irregulares de “segurança privada”, aumentando-lhes o poder e dando-lhes a visibilidade que já atravessa as fronteiras do país.
As milícias são organismos ilegais e ilegítimos, posto que cometem crimes como os apresentados, mas têm sido preferíveis ao tráfico mesmo pelos moradores das populações pobres, onde se instalaram e, principalmente, pelos policiais, já que nas áreas onde se estabelecem não ocorrem ataques, emboscadas, atentados ou qualquer tipo de ação intencional e premeditada contra suas vidas. A população, a seu turno, sente-se mais segura e livre das “balas perdidas”, que tanta vida inocente tem ceifado, além, com certeza, de beneficiar-se dos serviços ilegais, como a recepção dos sinais de televisão-a-cabo furtados, que lhes são vendidos a preços módicos.
As milícias não podem ser entendidas como um serviço complementar aos serviços da polícia, pois são ilegais e cometedoras de delitos. Onde as Polícias não mantém controle e ordem social, ou as comunidades estão sob forte influência de uma, ou de outra dessas forças ilegais, mas as milícias são o fenômeno em expansão e o tráfico em entropia.
O assunto “milícias” abarca outras questões, e uma delas é, seguramente, a ideológica. Explico: as milícias têm nos grupos de inspiração marxista, leninista, maoísta etc, empedernidos adversários; isso porque entendem-nas como “originárias da ordem”, oriundas, em grande parte, delas. Os milicianos são, ou foram, agentes públicos, quer sejam policiais, bombeiros, militares de qualquer Força, agentes penitenciários, guardas municipais, etc. Para esses grupos que entendem o processo revolucionário como instrumento legítimo de justiça social, o fortalecimento das milícias é um entrave aos seus planos, na medida que enfraquecem os braços do narcotráfico com os quais almejam contar numa eventual deflagração do conflito interno, como o protagonizado pela narco-guerrilheira das FARCS. Embora o modelo de aproveitamento do lúmpem não seja uma estratégia marxista, mas anarquista, em razão da falta de opções e incapacidade de angariar quadros para a almejada revolução – hoje mais fortemente acalentada em razão da esquerdização da América do Sul – os grupos de ideologia revolucionária não descartam seu uso como “companheiros de viagem”. Por isso, a existência do narcotráfico armado é fundamental para os quadros revolucionários, cada dia menos preocupados em camuflar suas intenções.
Em resumo, as milícias são estruturas de poder ilegal. Impõem-se pela força e haurem recursos financeiros a partir de expedientes ilegais, como ágios, sobretaxas, exploração e venda de serviços não autorizados. Elegem por inimigo o lúmpem; primeiramente o narcotráfico e, em seguida, os praticantes de roubo e furto, que atuam contra a população. Não entram em confronto com forças policiais, mas só agirão assim enquanto não romperem o limite máximo de suas violações, que é a narcotraficância ultra-rentável. Geralmente controlam as realizações sociais das suas áreas ou, no mínimo, interferem nelas, impedindo a realização de expressões culturais que julgam anti-sociais e de exaltação do poder adversário, como bailes funk e seus “proibidões”. Contam com a simpatia de considerável parte da população, não têm formação ideológica, são partidárias de políticas fisiológicas, populistas, e são consideradas inimigos formais e obstáculos cruciais ante uma estratégia que contemple a mobilização das armas do lumpesinato, para uma revolução.
Concluindo: Nenhuma dessas forças é legítima e, sem cegueiras e sem manipulações ideológicas, o Brasil precisa enfrentar e derribar as expressões da antidemocracia.
O Estado pode e a Nação merece.
7 comentários:
Sr. Mário Sérgio, acho exagero dizer que esquerdistas reconhecem traficantes como companheiros (mesmo que ocasionais)de revolução. É fato que alguns grupos de esquerda, ou extrema-esquerda pregam certa indulgência, mas também é fato que não existe tendência intrínseca ao marxismo para defender/colaborar com o tráfico. Já vi vários textos de esquerda que alertam justamente contra essa idéia grotesca e que na verdade seria um desserviço para qualquer mudança social, seja ela de "esquerda", ou não.
Prezado Giuliano
Honrado com vosso comentário, reconheço que o marxismo genuíno não é favorável ao emprego do lumpesinato como força de guerra: isso é próprio do pensamento de Bakunin. Mas, veja, as FARCs não pensam assim.
Abraços
Prezado Mário Sérgio
Concordando integralmente com seu excelente artigo publicado no O GLOBO de hoje (12/10/2007), devo acrescentar que a dupla-foco (sociólogo-produtor) não pode negar o concerto anterior à edição do livro e à produção conseqüente do filme (ou o contrário?...). Ora, nada foi casual e isso facilmente se deduz do agradecimento que "Luiz" faz a "José" no próprio exemplar editado pela OBJETIVA, logo no seu primeiro parágrafo (pág. 313): "Sou grato a Isa Pessôa e José Padilha, parceiros desde a concepção do projeto que gerou este livro."
Sobre o detalhe, acrescentei comentário ao meu artigo sobre o "livro-filme" disponível no meu blog. Para mim, e desde antes, eles ajustaram um ótimo negócio explorando simultaneamente dois extremos: ira contra a polícia corrupta somada à heroificação do bandido (público certo); raiva do bandido e heroificação de seus matadores (público certo). Não havia como errar, ainda mais contando com verba e dispondo de dois "inocentes úteis" (ou inúteis) no meio para legitimar tudo... Enfim, forjaram dois extremos, nada contextuais, em sistema fechado: sim-não. Porém ambos arrastando ss dois públicos, indistintamente, às livrarias e ao cinema, além de muitos curiosos como eu e você. Sem menoscabar o excelente desempenho dos atores, vejo tudo isso se resumindo no seguinte: corrida ao ouro!... Parabéns aos dois expertos! Tiro na mosca de longa distância temporal! Tiro de Caveira, no centro do alvo! Pêsames aos dois "lúmpenes PMs". Pois a PMERJ, por conta deles ambos, de um modo ou de outro, sifu!... E os expertos, de um extremo ao outro, alcançaram o lucro do qual, creio, os lúmpens PMS ganharão migalhas em fado de PM. Como sempre...
Emir Larangeira
Sr. Mário Sérgio;
De minha parte, vejo as Farc como um triste retrato de uma cultura política degenerada. Como o foram também tantos regimes autoritários (tanto da direita quanto da esquerda), que infestaram nosso século XX. Agradeço a atenção, e espero poder continuar trocando idéias por aqui. Abraço;
Giuliano
Muito bom o artigo !!
sempre que posso dou uma passada por este blog.
saudações
Caro Mário Sérgio,
a primeira vez que li notícias sobre milícias nos jornais cariocas pensei que estas eram um tapa na cara dos nossos políticos, afinal se é tão fácil para elas eliminar o narcotráfico, por que o Estado não é capaz de fazê-lo?
Depois ainda fiquei mais estarrecido ao ver todo o tipo de autoridade falando que era necessário coibir as milícias. Não discordo, mas acho que há uma inversão de prioridades: porque nossos políticos não falam em acabar com o tráfico? Mobilizam-se mais para denunciar as milícias que o próprio tráfico? Há algo muito errado aí. Se eu fosse mais cínico diria que as milicias devem estar incomodando políticos que se apoiam no tráfico, isso sim.
Concordo com o comentario anterior...pois estao dando mais valor ao traficante do que a eliminaçao deles...a milicia incomoda aos corruptos...pois qd se elimina o traficante nao há onde buscar a droga bem como o dinheiro para se fazer vista grossa do trafico...na verdade a populaçao nao está denunciando os milicinos...quem denuncia os mesmos sao os proprios bandidos que querem ver os milicianos longe para poderem voltar as suas atividades...conheço uma comunidade carente na zona oeste do RJ que a um ano nao se ouve um unico tiro, como tb nao se ve a milicia acharcando seus moradores...mas na epoca do trafico eram muitos tiros, muita bala perdida e muitas mortes. Ao q parece os bandidos estao fazendo toda essa esteria contra os milicianos e colocando a culpa neles...e tem gente até se dizendo miliciano para denegrir a imgem dos mesmos...sou contra qualquer tipo de agresao ao cidadao...mas quando vejo deliberarem em favor do trafico fico decepcionado...ao q parece, quem denuncia é aquele q iria receber uma grana e deixou de receber, e por isso estao fazendo esta propaganda contra a milicia e colocando a culpa de tudo q acontece nas milicias...percebem q agora nao se fala mais de traficantes e tao somente de milicianos?! se é bala perdida e da milicia, se morreu alguem foi a mando da milicia, se o jornalista é torturado foi a milicia, se prende um armeiro é da milicia...nao estou aki pra defender a milicia, mais mostrar que há algo errado nisso...lembremos de qd a polica entrava na comunidade infestada de bandidos...a bala perdida q matava o cidadao era sempre da policia...ora nessa comunidade q conheço por diversas vezes vi a policia entrar com um unico carro e nenhum tiro foi disparado...agora que nao tem bandido nao há razao pra policia entrar...isso incomoda...ora se o estado nao toma providencia, alguem tem q tomar...e cada um fazendo a sua parte...infelismente a milicia mexeu com a tv por assinatura..se nao fosse isto, eles ficariam se incomodar ninguem...é uma hipocresia preferir os traficantes do que a paz....mas da pra entender, afinal os maiores usuarios sao aqueles q combatem. Acreditar q o estado vais estar em todos os lugares tb é hipocresia...convenhamos.
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